Pesquisa canadense contraria argumento de comerciantes de que
restrição poderia gerar queda de faturamento e desemprego
Em alguns locais onde houve restrições, como na Flórida e em Nova
York, o que se verificou foi um aumento nas vendas
Donos de bares e restaurantes costumam pintar o apocalipse sempre que
o governo cogita banir o fumo em ambientes fechados. Falam em
desemprego em massa, em queda brutal de faturamento. Do outro lado do
ringue, militantes antifumo prevêem o paraíso após o banimento -dizem
que haverá aumento de vendas, que o ar dos bares vai mudar do enxofre
para um campo de lavanda na primavera.
Nenhuma dessas previsões está correta, segundo Rita Luk, pesquisadora
da Universidade de Toronto que fez um dos mais abrangentes estudos
sobre o impacto econômico do banimento do fumo em bares, restaurantes
e hotéis.
Luk revisou 115 pesquisas sobre essa questão e chegou à conclusão que
nesses trabalhos não foi possível concluir que o banimento do fumo
tenha algum impacto no faturamento dos estabelecimentos e no nível de
emprego.
A pesquisadora dividiu os trabalhos em duas categorias básicas: os que
usam critérios estatísticos aceitos no meio científico e são revisados
por pesquisadores da área (um dos indicadores de qualidade científica)
e os que usam dados subjetivos e são financiados por donos de bares e
restaurantes.
Entre as 51 pesquisas que usam dados objetivos, oito apontaram
impactos negativos da proibição, mas nenhuma delas havia sido revisada
por outros cientistas -por essa razão, não seriam aceitas numa
publicação científica de respeito. Das 64 que recorrem a dados
subjetivos, 19 concluíram que o banimento traz prejuízos a bares e
restaurantes.
Segundo a pesquisadora, a maioria dos trabalhos que usou dados
subjetivos "foi bancada pela indústria do cigarro ou por organizações
ligadas a essa indústria" como ela escreveu na pesquisa, publicada em
2005.
Os trabalhos que foram aprovados segundo os critérios científicos não
permitem concluir quase nada, afirma. "Estudos de alta qualidade
tendem a concluir que a legislação que proíbe o cigarro não afeta
negativamente a indústria da hospitalidade", conclui.
A história
O banimento do cigarro em bares e restaurantes começou nos EUA e se
espalhou pelo mundo numa velocidade impressionante. A primeira cidade
a banir o fumo foi San Luis Obispo, na Califórnia, em 1990. Hoje, o
fumo sofre restrições em praticamente todos os Estados americanos, na
maior parte da Comunidade Européia e começa a avançar no Japão.
A pesquisa canadense segue essa trajetória. O meio mais freqüente para
medir o impacto do banimento do fumo é acompanhar a arrecadação de
impostos de bares e restaurantes.
Na Flórida, onde o fumo sofre restrições desde 2003, um estudo
acompanhou a arrecadação de impostos e o nível de emprego entre
janeiro de 1990 e abril de 2004.
O resultado aponta que houve aumento de vendas e de emprego em bares e
restaurantes, mas não na chamada indústria da hospitalidade como um
todo, a qual inclui hotéis e parques como a Disneyworld.
Em Nova York, estudos feitos pelo departamento de saúde mostram que as
vendas em restaurantes cresceram 8,7% de abril de 2003, após o
banimento do fumo no Estado, e janeiro de 2004.
Há pelo menos duas explicações para o aumento: 1) os não fumantes, que
são maioria na população, passaram a ir mais a bares e restaurantes
com o banimento; 2) fumantes ficam mais tempo nos bares, mas não
consomem tanto quanto não fumantes.
A razão da preocupação
A indústria se preocupa com as restrições ao fumo porque esse tipo de
medida tem um grande impacto sobre as vendas. Um documento de 1992 da
Philip Morris, que se tornou público por ordem judicial, traz algumas
pistas em relação a esse impacto.
Pesquisa encomendada pela Philip Morris revelava à época que a
proibição do fumo nos locais de trabalho reduzia o consumo entre 11% e
15%. Entre os fumantes que sofriam esse tipo de restrição, a taxa dos
que queriam deixar de fumar era 84% maior que aqueles que podiam fumar
livremente no trabalho.
Se o fumo fosse banido de todos os locais de trabalho em 1992, o
consumo médio cairia de 8,7% a 10,1%. A indústria sabe muito bem como
funciona sua galinha dos ovos de ouro.